20070318

Pior cego é o que não quer ouvir



Um antigo conto Sufi diz que três viajantes debatiam sobre o que deveriam comprar para comer, uma vez que tinham pouco dinheiro.

Um deles dizia: “Eu tenho vontade de comer algo doce!”

Já o outro falava: “Eu não quero uma coisa só, mas várias...”

E o terceiro: “Não estou pensando em comida. Desejo algo para matar a minha sede!”

Cada um procurava reunir mais e mais argumentos em favor daquilo que queria e parecia impossível conciliar os seus diferentes desejos.
Até o momento em que um cego passou por eles e escutou a discussão, pegou o dinheiro dos três, levou-os até o mercado mais próximo e lhes comprou um cacho de uvas.
Sentar e escutar, muitas vezes, exige mais inteligência e coragem do que levantar e discursar.

Ouvir é uma faculdade que o nosso aparelho auditivo nos faculta.
Saber escutar com respeito, paciência e sem julgamentos, entretanto, é uma aptidão que adquirimos com o tempo.
Heráclito disse que quem não sabe escutar, não sabe falar.
Quando somos espiritualmente surdos, utilizamos com freqüência o expediente da violência verbal.

Silenciar não significa ser refém das palavras dos outros.
Quem vive se machucando com as afirmações dos demais ao seu respeito, acaba por ser tornar uma escultura de cristal com a qual ninguém quer conviver.
Devemos preservar o nosso coração de nossa própria afetação, melindres e suscetibilidades. Quem vive se machucando com tudo, acaba por se tornar capaz de coisas terríveis.

O melhor é ajudar sempre e não se aborrecer nunca.
Nenhum aliado ou amigo se sentirá obrigado a permanecer ao lado de alguém que está sempre se ferindo e criticando.
Reclamar não adianta. Só piora tudo.

A mágoa é uma erva daninha que arrasa a saúde de quem a cultiva.
A terra do coração é boa para se plantar o perdão. A grande diferença está na hora da colheita. Quando semeamos bons sentimentos, colhemos a paz.
Os outros são livres para pensar e falar de conformidade com os seus desejos.
Não somos obrigados a concordar, mas não devemos negar o direito, a quem quer que seja, de se expressar como queira ou possa.

Se contemplarmos a vida de um determinado modo, isso também é verdade em relação aos demais.
Os problemas, fatos e situações da existência são vistos de diferentes perspectivas.
Que terrível seria obrigar os outros a enxergar a vida com as nossas lentes. Certa vez, um oculista colocou os óculos de um paciente e disse com ironia: “Estou vendo o futuro!”

Grandes contribuições podem ser dadas por aqueles que têm um pensamento diferente. Negar-lhes a palavra pode significar a perda de excelentes oportunidades. Quando não nos dispomos a escutar, podemos estragar tudo.

Se os outros às vezes nos criticam, não devemos esquecer do apoio que eles nos prestaram em momentos decisivos, do calor que deles recebemos e do carinho que nos dedicaram em outras ocasiões. Sem compreensão e tolerância não podemos desfrutar do tesouro da convivência. Os outros são muito importantes. Sem eles, a jornada da vida seria a travessia de um deserto sem a esperança de um oásis.
A melhor política que podemos adotar é auxiliar e construir. Fazendo isso, estamos investindo na felicidade sustentável.

Quando escutamos, também somos escutados. Quando valorizamos, também somos valorizados.
Trata-se de um fato inegável: queremos ser amados, admirados, estimulados e elogiados. Como acontece conosco, os outros não estão na condição de anjos ou de demônios. Todos nós possuímos carências, problemas, sonhos e desafios parecidos.
Não podemos exigir que os outros nos necessitem.
Mas sempre podemos nos oferecer. Quando temos a disponibilidade de amar as pessoas, sem nos importar com o que elas dizem ao nosso respeito, estão amamos com leveza. Nossa importância está mais na capacidade e no dom de amar do que na necessidade que os outros possam ter de nós.
Todos nos somos necessários pela simples razão de que nos necessitamos uns aos outros. O que não significa nos tornarmos reféns uns dos outros.
A compreensão é o ingrediente fundamental de toda conversação, porque é ela quem desperta em nós a compaixão e a empatia.

Embora os outros não estejam obrigados a nos escutar, sempre poderemos escutá-los. Na lógica da vida, quem atende é atendido. Somente escutando podemos compreender e ser compreendidos.

Aprender a escutar os outros é o melhor exercício para educar a audição interior, que nos permite ouvir o silêncio, aonde ressoa a voz de Deus.
E olha que Deus fala e inumeras e imagináveis maneiras, que possamos
estar atentos a ouvir sempre.